Cristo é a Nossa Reconciliação com Deus [ EBD ] 2° Trim. 2020

Lição 07: Cristo é a Nossa Reconciliação com Deus

Lição 7: Cristo é a Nossa Reconciliação com Deus Escola Dominical | 2° Trimestre 2020Subsídio Apoio Ao Professor. 

(Efésios 2.14,15a) “Porque ele é a nossa paz, o qual de ambos os povos fez um; e, derribando a parede de separação que estava no meio, na sua carne, desfez a inimizade […]” 

Introdução 

A narrativa do antigo quadro desolador dos gentios (Ef 2.11-12) sofre uma significativa e relevante mudança. Paulo usa a expressão adversativa “mas, agora” (2.13a) para indicar que algo de extraordinário aconteceu e alterou a situação de outrora. O apóstolo explica que a diferença repousa na obra que Cristo fez em favor dos perdidos pecadores: “[…] vós, que antes estáveis longe, já pelo sangue de Cristo chegastes perto” (2.13). As palavras “longe” e “perto” fazem alusão à posição dos gentios e judeus em relação a Deus. Nesse caso, o povo de perto eram os judeus, e o povo de longe eram os gentios.

O Comentário Bíblico Beacon considera que a terminologia e o pensamento do escritor provieram das palavras do profeta Isaías no capítulo 57.19, que vaticinou “[…] paz, paz, para os que estão longe e para os que estão perto, diz o SENHOR, e eu os sararei”. Já o termo “antes” indica a condição passada dos gentios. A expressão faz paralelo com “noutro tempo” (Ef 2.11) e “naquele tempo” (2.12). Ambos os termos fazem contraste com a expressão “mas, agora” (2.13a), que enfatiza uma situação modificada no presente. Outro detalhe a ser observado é a expressão “em Cristo Jesus” (2.13b), em contraste com as palavras “sem Cristo” do verso anterior (2.12).

Sinaliza-se que a mudança que aproximou os gentios foi efetivada por obra do sangue de Cristo Jesus (2.13c). Como veremos em minúcias nas páginas seguintes, o propósito divino de trazer aqueles que estavam longe para perto dEle somente podia acontecer por meio da obra redentora de Cristo. A remissão dos pecadores afastados exigia derramamento de sangue (Hb 9.22), e foi o próprio Deus quem idealizou o plano da redenção por intermédio do sangue de Cristo (Ef 2.13). Para tanto, era necessário por meio da cruz de Cristo efetuar o ministério da reconciliação, desfazendo com ela as inimizades (2.16).

I. CRISTO DESFEZ A INIMIZADE ENTRE OS HOMENS 

1. A Parede de Separação entre os Homens

Ao descrever as mudanças que alteraram o quadro desolador dos gentios, Paulo afirma que judeus e gentios passaram a ser um só povo pelo sangue de Cristo, tendo sido derrubada a parede de separação (2.13-14). Ao usar a expressão “parede de separação”, o apóstolo faz uma analogia com as muralhas do Templo em Jerusalém. A estrutura da construção era uma demonstração do exclusivismo espiritual do judaísmo

Entre o santuário e o átrio dos gentios, havia um muro de pedra com a proibição de acesso aos estrangeiros: De qualquer lugar os gentios podiam olhar e observar o templo, porém não tinham permissão de aproximar-se dele. Estavam impedidos pelo muro que o circundava, uma barricada de um metro e meio de pedra sobre a qual estavam colocados, em seguidos intervalos, avisos em grego e latim. Na verdade, esses avisos não diziam: “os intrusos serão processados” e sim “os intrusos serão executados”. O extremismo quanto a esse aspecto levou Paulo à prisão, onde foi acusado de permitir um grego ultrapassar essa barreira (At 21.28-30).

Na ocasião, o apóstolo outra vez sentiu na pele o fanatismo dos seus conterrâneos. Embora questionasse a eficácia dos rituais judaicos, para apaziguar os judeus cristãos, ao término da sua terceira viagem missionária, Paulo submeteu-se ao rito da purificação (At 21.26). Essa postura do apóstolo pode ser compreendida pelo seu desejo de ganhar o maior número de pessoas para Cristo (ver 1 Co 9.20). Contudo, apesar do esforço em abrandar os ânimos dos judaizantes, alguns judeus da Ásia, vendo-o no templo, acusaramno de ensinar a todos a ser contra os judeus, contra a Lei e contra o templo; além disso, imputaram-lhe o crime de “profanação” por supostamente ter autorizado a entrada no santuário do gentio Trófimo, de Éfeso (At 21.28-29).

Diante disso, sublevaram-se as emoções, e a cidade entrou em alvoroço, arrastando Paulo para fora do templo a fim de linchá-lo, mas a intervenção do tribuno poupou a vida do apóstolo (At 21.30-34).

2. A Derrubada da Parede da Separação 

Retomando o tema da declaração paulina, da qual em Cristo foi derrubada “a parede de separação que estava no meio” (Ef 2.14b), é possível afirmar que essa barreira era tanto literal quanto espiritual. É literal não no sentido histórico de o muro de pedra deixar de existir fisicamente, mas no sentido de terem sido revogadas as restrições, que, outrora, foram o propósito da sua construção; é espiritual porque todos os que creem (tanto judeus quanto gentios) em Cristo têm acesso diretamente à presença de Deus-Pai. Porquanto, foi por mérito da cruz de Cristo que a divisória foi rompida, da qual o muro era um símbolo de separação.

Por causa daquilo que Cristo fez na sua carne, isto é, pelo seu corpo entregue por nós e pelo seu sangue vertido nos flagelos da crucificação, a inimizade e a barreira foram desfeitas (2.15a). Em Cristo, deixamos de ser indignos forasteiros e de ser alienados das promessas messiânicas. Na Nova Aliança, não há mais impedimento de aproximação à presença do Deus único, santo e verdadeiro. Pertencemos à família de Deus; por causa de Cristo, judeus e gentios têm “acesso ao Pai em um mesmo Espírito” (2.18). 

E, ainda, conforme ensina o escritor aos Hebreus, não existe mais razão para os gentios temerem a terrível sentença da muralha escrita em grego e latim: “os intrusos serão executados”, pois agora temos “ousadia para entrar no Santuário, pelo sangue de Jesus, pelo novo e vivo caminho que ele nos consagrou” (Hb 10.19-20).

3. O Conceito da Lei dos Mandamentos 

O apóstolo assevera que Cristo “desfez a inimizade, isto é, a lei dos mandamentos, que consistia em ordenanças” (Ef 2.15b). Aqui, cabe perguntar em que sentido a “lei dos mandamentos” foi anulada em Cristo. A interpretação ortodoxa considera que, “em Cristo”, foi eliminado o legalismo, que era utilizado pelos judeus como meio de obtenção da vida eterna e da santificação (Rm 8.2). Assim, a melhor compreensão desse conceito repousa na visão tripartida da Lei Mosaica: moral, cerimonial e civil, que são três partes de uma mesma lei.

A lei civil ou judicial diz respeito ao israelita como cidadão. Nesse sentido, o Dicionário Bíblico Wycliffe avalia que tais leis não devem ser consideradas como extensões ou aplicações dos Dez Mandamentos; ele acrescenta: “essas leis específicas foram outorgadas principalmente à nação de Israel da Antiguidade, e a sua aplicação à vida cristã atual deve ser governada pelos princípios básicos estabelecidos no NT”.

Por outro lado, a Lei Moral, exceto o rito da guarda do sábado, permanece em vigor como padrão de conduta, mas não como meio de salvação (ver Ef 2.8,9). O entendimento da validade da lei moral para nossos dias é de vital importância contra os extremos, tanto do legalismo como da licenciosidade:

Lei moral. A atitude do cristão em relação a essa parte da lei de Moisés pode ser resumida da seguinte maneira: (1) Ninguém pode ser salvo apenas obedecendo aos Dez Mandamentos. Esse fato não só é explicado claramente no NT (At 13.39; Rm 3.20, Gl 2.16), como também é aceito pela maioria dos cristãos. (2) Entretanto, esses mandamentos ainda estão válidos por que levam o cristão a descobrir a natureza e o poder do pecado. Essa verdade é ensinada por Paulo (Rm 3.20; 5.20; 7.7; Gl 3.19). E ele é universalmente reconhecido pelos cristãos. 

(3) Como a lei é “santa” (Rm 7.12), ela é uma fonte de prazer espiritual para os filhos de Deus. Essa abordagem da lei moral ainda válida para o cristão de nossos dias é magnificamente descrita no salmo 119.97 […] (4) Ela também representa uma norma para vida cristã porque quase todos os Dez Mandamentos são repetidos especificamente em um princípio aplicável ao crente (Mt 5. 21-48; Rm 7.7; 13.9; 1Co 8.1-6; 10.14-22; Ef 5.3-5; 6.1-3).

No Novo Testamento, só está faltando o mandamento referente à guarda do sábado. Assim sendo, a lei moral do Antigo Testamento funciona como um guia para conhecer a vontade Deus, e faz parte do padrão de nossa santificação. Ao mesmo tempo, os requisitos da lei são exercidos apenas pelo Espírito Santo quando ele opera no interior e por meio de cada crente (Rm 8.3-4).

Nesse ponto, convém ratificar e ressaltar que a guarda do sábado é o único preceito do Decálogo não repetido no Novo Testamento para ser observado pelo cristão (ver Cl 2.16). O sábado é um preceito cerimonial, pois é colocado no mesmo nível do ritual do templo (Mt 12.2-4).Desse modo, concordes com as citações acima, não é acerca da lei civil (restrita aos israelitas) ou da lei moral (ainda em vigor) que Paulo fazia referência no versículo em apreço. Nessa concepção, só nos resta como alternativa a revogação da lei cerimonial que a versão Nova Tradução da Linguagem de Hoje (NTLH) denomina como “seus mandamentos e regulamentos” (Ef 2.15).

Na sua Epístola aos Colossenses, Paulo enumera esses regulamentos como sendo a “circuncisão”, “sacrifícios”, “comida e bebida”, “dias de festas, lua nova e sábados” (Cl 2.11,16-21). Esses ritos identificavam a posição do povo judeu diante de Deus e gerava hostilidade com os gentios.

4. A Revogação da Lei dos Mandamentos

Seguindo a linha interpretativa já exposta no ponto anterior, a eliminação das barreiras deu-se pela revogação da “lei dos mandamentos, que consistia em ordenanças” (Ef 2.15b). Essa revelação não contradiz as palavras de Cristo, que disse: “não vim ab-rogar, mas cumprir” (Mt 5.17). Ao entregar o seu corpo para ser crucificado, Cristo cumpriu a Lei oferecendo-se como sacrifício vivo em favor de ambos os povos (Hb 7.27). Desse modo, a revogação realizada por Cristo e aqui aludida diz respeito à lei cerimonial: Essa lei prescrevia uma série de ritos e cerimônias exteriores e consistia em muitas instituições e compromissos concernentes às partes exteriores da adoração divina.

As cerimônias legais foram anuladas por Cristo, sendo cumpridas nEle. Ao tirar isso do caminho, ele formou uma igreja de crentes, incluindo judeus e gentios […]. Ele formou desses dois partidos uma nova sociedade, ou um novo corpo do povo de Deus, unindo-os consigo mesmo como Cabeça comum. Esse conjunto de regras e regulamentações do Código Mosaico intensificou-se desde o regresso dos judeus do exílio babilônico.

A religião judaica tornou-se profundamente legalista. Hendriksen afirma que “a ênfase recaía sobre a obediência às ordenanças tradicionais. Ora, foi essa mesma ênfase sobre estipulações cerimoniais, acrescidas ainda daquelas estipulações contidas na lei mosaica, o que formou o muro divisório entre judeus e gentios”.

O Comentário Bíblico Pentecostal do Novo Testamento ratifica esse posicionamento e assegura que: Cristo aboliu a lei, que trazia um código escrito de regulamentos sobre sacrifícios de animais, questões alimentares, regras sobre a limpeza impureza, e etc. — Que criava uma séria barreira entre judeus e gentios e que resultava em um particularismo judeu e em uma exclusão dos gentios.Esse formalismo e exclusivismo extremado por parte dos judeus resultaram em separação e hostilidade.

No entanto, o ato de Cristo, oferecido a Deus em cheiro suave, aboliu a necessidade dessas ordenanças ritualísticas; assim, a inimizade foi desfeita (Ef 2.15; 5.2). A passagem enfatiza que Cristo, ao entregar-se por nós como oferta e sacrifício a Deus, anulou a lei de cerimônias e toda a sua força escravizadora, com o propósito de criar em si mesmo um novo homem dos dois povos (judeus e gentios), fazendo a paz (2.15c).

II. PELA PAZ, CRISTO FEZ UM NOVO HOMEM

1 – O Conceito Bíblico de Paz 

Em termos gerais, a paz é a descrição de boas relações (At 24.2), fim de um conflito (Lc 14.32), estado de tranquilidade (1 Rs 4.24), um dom de Deus (Is 45.7) e uma qualidade espiritual (Gl 5.22). Segundo o Dicionário Vine, no Antigo Testamento, o substantivo hebraico shalôm significa “paz, completitude, perfeição, bem-estar, saúde”. O uso do termo é frequente (237 vezes) e variado na sua amplitude semântica. Nas Escrituras da Nova Aliança, o substantivo grego correspondente eirene ocorre em cada um dos livros do Novo Testamento, exceto na primeira Epístola de João.

O Dicionário Bíblico Wycliffe corrobora com esse entendimento e descreve a dádiva da paz nos seguintes termos: O homem que recebe esta aliança de paz com Deus deve buscar esta paz no aumento da sua santificação (1 Ts 5.23; Hb 12.14; Cl 3.15; 1 Pe 3.11), pela obra do Espírito, que gera como um fruto particular a própria paz (Rm 8.6; 15.13; Gl 5.22). Ele não deve viver com medo e ansiedade, porque o tesouro do legado da paz de Cristo foi colocado no seu coração (Jo 14.27). Sua serenidade de mente e tranquilidade interior em Cristo não dependerão, nem serão abalados pelo fato de vir a ter tribulações neste mundo maligno (Jo 16. 33).

Estando em paz com seus companheiros cristãos através da graça de Deus, ele se esforçará com aquela motivação para manter a unidade do Espírito no vínculo da paz (Ef 4.3; 2 Co 13.11; 1 Ts 5.13).158 Nesse diapasão, na Teologia Sistemática editada por Stanley Horton, o pastor pentecostal David Lim ratifica que “devemos esforçar-nos por manter a unidade do Espírito no vínculo da Paz (Ef 4.3). A paz é condição fundamental para progredirmos na união, para acolhermos os ministérios de outras pessoas e para aprendermos, ainda que através dos fracassos”.

Nesse aspecto, na passagem em Efésios 2.14, o apóstolo ressalta a paz conferida por meio de Cristo. A sua morte na cruz desfez a inimizade com Deus e entre os homens e tornou possível a reconciliação entre ambos promovendo a paz (Cl 1.20). 2. Cristo é o motivo de nossa paz Paulo declara que Cristo “é a nossa paz” (Ef 2.14b). Essa expressão aponta para uma conotação mais profunda. Cristo não é apenas o “autor da paz”, mas também é literalmente “a nossa paz”. Hendriksen declara acertadamente “o que nenhuma outra coisa — seja a Lei com as suas ordenanças, sejam os méritos humanos, sejam as obras da Lei de toda e qualquer espécie, sejam sacrifícios, etc. — jamais poderia fazer.

Ele, tão somente Ele, na sua própria pessoa, fez, porquanto Ele é a própria encarnação da paz”. Isso implica no conceito de “comunhão espiritual”, isto é, Cristo habita em nós sendo Ele próprio nossa paz (Jo 14.23-27). Nessa perspectiva, Foulkes assevera que: Não é suficiente dizer que Cristo traz a paz. Ele é a nossa paz. À medida que os homens passam a estar nEle, e continuam a viver nEle, encontram paz com Deus, e, desse forma também um ponto de encontro com o seu semelhante, quaisquer que tenham sido anteriormente as divisões de raça, cor, posição social ou credo.

Ele veio com este propósito (Lc 2.14), para ser Príncipe da Paz, e de fato, foi assim que os profetas predisseram a sua vinda (Is 9.6; 53.5; Ag 2,9; Zc 9.10).161 Desse modo, a expressão refere-se à paz que repousa na Igreja, onde, pela fé, Cristo habita no interior dos crentes (ver Ef 3.17). No texto correlato de Colossenses 1.20, aprendemos que essa paz deu-se “pelo sangue da sua cruz”, quando Cristo reconciliou todas as coisas consigo mesmo. Assim, Cristo é a razão de nossa paz; Ele é nosso pacificador. A paz conquistada por Ele possibilitou a comunhão entre o crente e Deus e entre judeus e gentios, agora reconciliados em um único povo em Cristo Jesus, a Igreja (Ef 2.14.b). 

2 – A Nova Humanidade formada pela Paz 

Em continuação, o apóstolo ratifica que Cristo uniu os povos que outrora se hostilizavam para criar “em si mesmo dos dois um novo homem, fazendo a paz” (2.15c). Essa unidade não foi o resultado de algum acordo firmado entre os homens. Toda e qualquer tentativa humana nesse sentido jamais logrou êxito. Todos os acordos de trégua sucumbiram ante a natureza humana pecaminosa e egocêntrica. Assim, a reconciliação da raça humana foi realizada “em si mesmo”, ou seja, o único modo possível era “em Cristo” e “por meio de Cristo”.

Stronstad reforça esse entendimento ao assegurar que “Cristo, e somente Cristo, nos deu a solução para esse problema que infesta à raça humana, isto é, a separação de Deus e de outras pessoas. Ele é a reconciliação do povo com Deus e a reconciliação das pessoas umas com as outras. Assim, o evangelho torna-se uma mensagem de reconciliação (2 Co 5.17ss.)”.A partir desse ato de reconciliação efetuado no Calvário, Cristo formou uma nova humanidade, a Igreja, “onde não há circuncisão e nem incircuncisão” (Cl 3.11). Foi Cristo quem criou esse novo povo “fazendo a paz” (Ef 2.15c). As desigualdades e a animosidade foram eliminadas.

Em Cristo, não há acepção de pessoas, raça ou classe social (Rm 2.11; Gl 3.28). Porém, essa unidade não se deu apenas pela ascensão dos gentios para a mesma posição dos judeus. Ambos foram elevados para desfrutar de algo maior, o “novo homem, que, segundo Deus, é criado em verdadeira justiça e santidade” (4.24).

III. PELA CRUZ, RECONCILIADOS COM DEUS EM UM CORPO

1 – Cristo fez-se Maldição por Nós 

Ser condenado à morte de cruz era sinal de maldição e profunda humilhação (ver Hb 12.2). Hagner salienta que “a morte por crucificação era uma das mais desprezíveis formas de pena capital do mundo romano. Os cidadãos romanos estavam automaticamente protegidos contra esse tipo de punição, considerada adequada apenas para os estrangeiros”.O martírio da cruz era ultrajante e desumano. O réu era fortemente açoitado com um chicote de várias tiras de couro com chumbo ou ossos nas pontas (ver Mc 15.15). 

Após o flagelo dos açoites, o condenado era obrigado a carregar publicamente a sua cruz até o lugar da execução (Jo 19.17). Quanto a esse aspecto, Simão, o cireneu, foi constrangido a ajudar a Jesus (Mt 27.32). Após uma noite de tortura e açoites, Ele estava fraco demais para carregar a sua própria cruz. Isso revela a intensidade dos sofrimentos que Cristo sofrera antes mesmo de ser crucificado. Entretanto, por amor, como cordeiro mudo, Ele submeteu-se ao ultraje e “não abriu a sua boca” (At 8.32). Diante dessa humilhante exposição e desonra pública, degradação do ser humano, vergonha e vexame diante da sociedade, a morte de cruz era escândalo para os judeus e loucura para os gentios (1 Co 1.23).

Apesar disso, Cristo não se deixou intimidar pela ofensa à sua dignidade e à sua honra. Ele suportou a afronta e os terríveis golpes desferidos contra a sua carne. Cristo levou nossa culpa, derramou o seu sangue, entregou o seu corpo para ser crucificado e fez-se maldição em nosso lugar (Gl 3.13).

2 – Reconciliados pela cruz de Cristo 

Foi o sacrifício vicário de Cristo na cruz e a sua consequente vitória sobre a morte que possibilitou nossa reconciliação com Deus e também com os homens (Cl 1.20). Paulo enfatiza que, “pela cruz, [Cristo] reconciliou ambos com Deus em um corpo, matando com ela as inimizades” (Ef 2.16). Dessa forma, o sangue vertido no sacrifício de Cristo expiou nossos pecados. Biblicamente, expiar é pagar, quitar, perdoar mediante um sacrifício reparador, por meio da morte de alguém como substituto do culpado. Por conseguinte, a “expiação pelo sangue [de Cristo] foi necessária para dar satisfação à lei divina — caso contrário, essa lei seria vã — e o seu legislador escarnecido”.

Desse modo, Cristo pagou nossa dívida com a Lei e com o legislador na cruz (Cl 2.14). Ele fez-se pecado por nós, e a sua expiação efetuou a reconciliação: O Novo Testamento ensina com clareza que a obra salvífica de Cristo é um trabalho de reconciliação. Pela sua morte, Ele removeu todas as barreiras entre Deus e nós […]. O verbo Katallassõ e o substantivo Katallagê transmitem com exatidão a ideia de “trocar” ou “reconciliar”, da maneira como se conciliam os livros contábeis. No Novo Testamento, o assunto em pauta é primariamente o relacionamento entre Deus e a humanidade.

A obra reconciliadora de Cristo restaurou-nos ao favor de Deus porque “foi tirada a diferença entre os livros contábeis” […].Nesse aspecto e como resultado dessa maravilhosa obra, como já vimos, Cristo é apresentado por Paulo como sendo “a nossa paz” (Ef 2.14). E também fomos instruídos pelo apóstolo que, por intermédio do sacrifício na cruz, Cristo criou “um novo homem, fazendo a paz” (2.15). E, ainda, Paulo acrescenta e enfatiza que Ele “evangelizou a paz”, proclamando ao mundo as Boas Novas que fizera na cruz (2.16,17). Matthew Henry, ao discorrer acerca da expressão “evangelizou a paz”, considera que Cristo publicou os termos da reconciliação com Deus e da vida eterna na cruz. 

3 – Reconciliados na cruz em um corpo 

Paulo reforça que o propósito de Cristo foi o de “reconciliar ambos (judeus e gentios) com Deus em um corpo” (Ef 2.16b). A ênfase aqui recai sobre a inimizade existente na vertical: entre os homens e Deus. Em versículo anterior, o destaque era a inimizade horizontal: entre os judeus e os gentios (2.14). De forma que a reconciliação deve ser duplamente compreendida. As duas inimizades foram desfeitas quando Cristo levou nossos pecados no madeiro (1 Pe 2.24). Nesse contexto, na Teologia Sistemática editada por Stanley Horton, o pastor pentecostal Daniel B. Pecota realça que, em uma genuína e sincera reconciliação, “a parte lesada desempenha um papel primário.

Se a pessoa lesada não demonstrar a disposição de acolher quem a lesou, não haverá reconciliação”.167 Nesse caso, ratifica-se “o favor imerecido” de Deus para conosco. Foi Ele quem tomou a iniciativa de reconciliação. A ira divina, que repousava sobre nós por causa dos pecados, ficou cravada na cruz de Cristo por amor e graça (Cl 2.13,14). Assim, pela cruz, a reconciliação foi concretizada, gerando um novo povo, tornado em um único corpo: a “família de Deus”, a “Igreja de Cristo” (Ef 2.19; 3.6; 4.4; 5.23,30).