Atributos da Unidade da Fé: Humildade, Mansidão e Longanimidade [ EBD ] 2° Trim. 2020

Lição 11: Atributos da Unidade da Fé: Humildade, Mansidão e Longanimidade

Lição 11: Atributos da Unidade da Fé: Humildade, Mansidão e Longanimidade Escola Dominical | 2° Trimestre De 2020 – Subsídio Apoio ao Professor

Texto Áureo: (Efésios 4.1) “Rogo-vos, pois, eu, o preso do Senhor, que andeis como é digno da vocação com que fostes chamados.”  

Introdução

Nessa seção de Efésios 4.1-6, Paulo apresenta relevantes aspectos doutrinários ligados à unidade da Igreja. Como visto no capítulo anterior, o apóstolo intercedeu em favor da Igreja e estimulou os eleitos a viverem para a glória de Deus (3.16-21). Após essa assertiva, Paulo enfatiza que os cristãos serão capazes de glorificar a Deus quando entenderem o propósito da unidade divina e vivenciarem-na (4.1-16). A responsabilidade individual requer do cristão um relacionamento adequado com os membros do corpo de Cristo (4.2), e a responsabilidade coletiva inclui o compromisso de preservar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz (4.3).

O Comentário Bíblico Beacon assinala que “a tarefa da igreja é ser a unidade e, para cumprir sua missão no mundo, a igreja tem de exemplificar, pela união entre os seus membros, o poder e a glória da graça de Deus”.Isso denota que, quando a Igreja testemunha de Cristo por meio da unidade, pessoas são atraídas e experimentam transformação pelo poder divino. Por conseguinte, o corpo de Cristo deve viver em unidade, tendo em vista glorificar a Deus e servir de bom testemunho à sociedade. Para tanto, o apóstolo exorta à unidade e a um andar digno para o cumprimento dos excelsos propósitos divinos para com os crentes salvos.

Nessa perspectiva, estudaremos no capítulo em apreço o conceito bíblico da verdadeira comunhão e as qualidades fundamentais que os crentes devem evidenciar diariamente para manter o bom relacionamento e a unidade no corpo de Cristo. Essas qualidades são virtudes concedidas pelo Espírito Santo e relacionadas por Paulo como humildade, mansidão e longanimidade (4.2). 

I. A HUMILDADE E A COMUNHÃO COLETIVA

 1. A maneira Digna do Viver Cristão 

O código de ética de todos os cristãos é a Bíblia Sagrada. A constatação se um crente é um cristão moral ou imoral vai depender da sua conduta em cumprir os preceitos éticos das Sagradas Escrituras. Nesse aspecto, essa seção da Epístola aos Efésios apresenta uma orientação paulina acerca da conduta geral dos crentes. Paulo, mesmo encarcerado e impossibilitado de viajar, faz um apelo, por intermédio dessa epístola, para que os crentes “[andem] como é digno da vocação” (4.1). É importante destacar que o termo “andar” é usado de modo metafórico. Nesse sentido, salienta-se que o termo peripateo (andeis) é um verbo que está conjugado no modo infinitivo, no tempo aoristo e na voz ativa.

Isso significa que a ação de “andar” redigida por Paulo não é uma ação temporária, mas, sim, um comportamento que outrora iniciou e que deve ser persistido constantemente, ou seja, o cristão deve viver de maneira digna da vocação (NAA) ou se comportar dignamente (Bíblia Pastoral — Paulus). O Comentário Bíblico do Novo Testamento – Aplicação Pessoal frisa que ser digno significa estar em equilíbrio, como uma balança. Desse modo, “os crentes devem viver em equilíbrio com o seu chamado.

O modo como agem deve estar de acordo com aquilo que crêem”.Essa conduta, que deve ser diária e constante, tem significado de suma importância no aspecto de como deve o cristão corresponder à chamada recebida para ser membro do corpo de Cristo e evidenciar as seguintes virtudes: A mansidão é a virtude cristã pela qual vivemos tranquila e pacificamente com nosso próximo, sem ficar irados com ele e sem o tratar asperamente por causa de sua falta de habilidade, sua baixa condição social ou sua fraqueza […].

Isso é o que é a mansidão, tanto na nossa mente quanto no nosso comportamento. Devemos ser mansos com os outros em todo o tempo e em todas as circunstâncias, não apenas ocasionalmente ou em uma coisa, ou outra, como nos convier. A paciência que devemos ter uns com os outros em amor é o mesmo que perdão e compreensão mútuos. É o oposto exato de guardar rancor e não mostrar simpatia pelos outros. Na igreja, esse tipo de paciência preserva a unidade da doutrina e a paz.

Para isso, o apóstolo apresenta instruções práticas de como Deus deve ser glorificado pela Igreja. O andar do cristão está diretamente relacionado com o seu nível de comunhão com Deus e com os irmãos. Assim, para manter e desenvolver essa comunhão, Paulo enfatiza três virtudes essenciais e interligadas: a humildade, a mansidão e a longanimidade (4.2). 

2. A Virtude da Humildade 

Após o apóstolo orientar que os cristãos devem viver de modo digno com a vocação recebida, ele enumera, divinamente inspirado, as já citadas três virtudes essenciais da chamada cristã para que os salvos possam viver a unidade da fé. Ele inicia com uma dádiva que está conectada e interligada com a mansidão e a longanimidade, a saber, a humildade (4.2). Esta é a única dessas três virtudes que não aparece de modo explícito na lista do Fruto do Espírito (Gl 5.22- 23), e isso porque a humildade está intrinsecamente associada à verdadeira mansidão (Mt 11.29; Cl 3.12).

Destaca-se, também, que os povos pagãos e as religiões antigas entendiam que a prática da humildade era uma atitude negativa, de fraqueza de caráter e de falta de amor próprio. Assim, quando Paulo redige essa epístola e convoca os cristãos a viver e a andar com “toda a humildade”, o apóstolo entra na contramão da cultura e da religiosidade da época. Os contemporâneos de Paulo confundiam a humildade como gesto de inferioridade. O Dicionário Bíblico Wycliffe clarifica que esses dois conceitos não se coadunam e realça que a humildade é uma graça divina desenvolvida no cristão pelo Espírito de Deus.

Sublinha-se, nesse sentido, que o maior exemplo de humildade foi demonstrado por Cristo Jesus, pois Ele “não teve por usurpação ser igual a Deus. Mas aniquilou-se a si mesmo, tomando a forma de servo” (Fp 2.5-8). Hendriksen avalia que, “quando Ele [Cristo] renunciou sua existência numa forma de igualdade a Deus, naquele fato ele assumiu tudo quanto era contrário a ela, ou seja, sua natureza humana. Assim, pois, ele se esvaziou ao tomar a forma de um servo”.

Outro grande exemplo de humildade demonstrado por Cristo ocorreu por ocasião da Páscoa antes da sua crucificação. Ele tomou a posição de servo e lavou os pés dos apóstolos (Jo 13.13-15). Cristo não realizou tal prática para demonstrar qualquer espírito de autocomiseração — assim como faziam os fariseus. Ao contrário disso, o Salvador, que reina desde o princípio e que reinará para sempre, ensinou-nos de forma prática que, para haver unidade no Corpo de Cristo, é necessário ter humildade. Nosso Mestre não ensinava apenas no campo das ideias, ou seja, teoricamente, mas o verdadeiro Rabi instruía o povo e os seus discípulos com ousadia e exemplo.

O teólogo F. F. Bruce (1910–1990), comentando esse versículo, enfatiza que Jesus transmitia no seu ensino “tanto por preceito quanto por prática”.Nesse sentido, o intuito de Paulo é o de asseverar e exortar aos seus leitores que a conduta humilde de alguém não é aquela hipócrita movida pela aparência e atrelada ao falso discurso (ver Is 32.6; Mt 23.27-28); antes, refere-se às ações daquele que não é contencioso e que reconhece a importância e o valor do outro (Fp 2.3). 

3. A Verdadeira Humildade 

Como mencionado no tópico anterior, Cristo ao lavar os pés dos seus discípulos demonstrou um grande exemplo de humildade. O costume de lavar os pés dos convidados era uma conduta comum na cultura judaica, no entanto, quem realizava tal prática era os escravos, jamais o anfitrião. Assim, a atitude tomada por Cristo demonstra que a pessoa verdadeiramente humilde comporta-se com modéstia em oposição ao orgulho, a soberba e a arrogância (2 Co 12.20). Em outras palavras, a humildade refere-se a uma postura despretensiosa, modesta e isenta de vaidade, que favorece o bem da coletividade, e não o egoísmo (Jo 17.21-23).

Ser humilde também significa ser autêntico, isto é, reconhecer as suas fraquezas e limitações e ser honesto consigo mesmo e com os outros. Porém, é preciso estar alerta quanto à falsa humildade, que é o comportamento dissimulado por alguns e que é confundida por outros como baixa autoestima, timidez, complexo de inferioridade ou autocomiseração. A verdadeira humildade coopera para a harmonia nos relacionamentos sociais e promove a comunhão e a unidade no corpo de Cristo (1 Co 12.25). Essa e as demais virtudes são produzidas somente pelo Espírito de Deus, que habita no crente (Ef 3.16).

Ninguém consegue desenvolver tal conduta se não for transformado pelo Espírito Santo (Gl 5.16). Isso quer dizer que uma pessoa que não foi justificada, regenerada e santificada não poderá ser verdadeiramente humilde. Ressalta-se que, no versículo em estudo, cada virtude mencionada pelo apóstolo é precedida pela palavra “toda”: “Com toda a humildade e mansidão, com longanimidade” (Ef 4.2); isso indica que a conduta cristã deve ser em grau elevado, e não superficial. 

II. MANSIDÃO E CONCILIAÇÃO 

1. Mansidão, Fruto do Espírito 

Paulo faz uso do termo grego prautetos para enfatizar que os irmãos necessitam comportar-se com mansidão para viverem de modo digno. Ressalta-se que esse é o mesmo cognato utilizado pelo apóstolo ao listar as virtudes do Fruto do Espírito no seu primeiro escrito, a Epístola aos Gálatas (5.22-23). No texto grego, em ambas as passagens, os vocábulos são substantivos femininos no singular.

A única diferença é que, em Gálatas, o substantivo é nominativo (sujeito do verbo — característica do Fruto do Espírito); e em Efésios, o substantivo está no genitivo (no sentido possessivo).Desse modo, acentua-se que a palavra “mansidão” transmite o conceito de “ternura”, “gentileza”, “cortesia” e “paciência” (1 Co 4.21; 2 Co 10.1; 2 Tm 2.25). O Dicionário Vine assevera que a mansidão não consiste apenas no “comportamento exterior da pessoa [com o próximo]”, porque “é uma graça da alma; e cujos exercícios são primeira e primariamente com Deus” e ainda está relacionado com a virtude anteriormente explicitada pelo apóstolo dos gentios, a humildade.

Nesse sentido, é importante frisar que o teólogo pentecostal David Lim arrazoa que possuir mansidão é ter o “espírito disciplinado” e “saber que Deus está cuidando de tudo, e por isso não toma a vingança nas próprias mãos (Rm 12.17-21; Ef 4.26)”.Refere-se a uma qualidade de equilíbrio que leva em consideração o bem-estar do outro e, portanto, não reage com impaciência ou de forma iracunda.

Denota maturidade espiritual e plena confiança na soberania divina. Sublinha-se também que, para Antonio Gilberto, o aspecto da mansidão, como uma virtude do Fruto do Espírito Santo, “talvez” seja a característica mais complicada de explicar da lista de Gálatas 5.22-23, porque a mansidão está intrinsecamente guardada no caráter pessoal, e, assim, somente o Senhor Deus Onisciente e a própria pessoa sabem realmente “quem são os mansos de coração”.Em síntese, a mansidão é a ação que deriva da humildade. Um dos “Pais da Igreja”, João Crisóstomo (347–407), ensinou que pode acontecer de alguém ser, em certo sentido, humilde e, apesar disso, severo e iracundo.

Todavia, essa aparente humildade não é proveitosa, pois, ao ser dominado pela ira, tal pessoa irá perder tudo.Por conseguinte, o termo bíblico indica moderação nas ações, bom trato para com o seu semelhante e ausência de precipitação. Isso retrata o caráter de Cristo, pois o Senhor mesmo disse: “[…] aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração” (Mt 11.29).

2. A Verdadeira Mansidão

Como já observado, as pessoas com a virtude da mansidão têm o espírito disciplinado e a capacidade de perseverar na perseguição (Rm 12.12-14).

Elas não revidam os maus-tratos sofridos e não se apressam em emitir juízo (Rm 12.17-19); também não cedem às provocações e nem dão espaço para ressentimentos (Hb 12.15). A sua postura evita constrangimentos desnecessários e ameniza os conflitos, contribuindo, assim, para a harmonia e a unidade no corpo de Cristo. Ratifica-se, ainda, que a verdadeira mansidão está intrinsecamente interligada à humildade. Uma pessoa que é mansa também é humilde.

Não obstante, assim como entre os pagãos da antiguidade, hodiernamente em determinados círculos, os que evidenciam essa virtude são classificados pejorativamente como “fracos”, “medrosos”, “inseguros”, “covardes”, “servis” e outros termos igualmente depreciativos. Contudo, mesmo diante de toda essa hostilidade, as Escrituras exortam o cristão a andar com “toda a mansidão” (Ef 4.1-2). Assim, ser manso não significa ser fraco ou inferior, ou mesmo adquirir conduta de autodepreciação; pelo contrário, indica o perfeito controle das emoções e sentimentos (Rm 6.22; Gl 2.20).

A virtude da mansidão trata da submissão do homem para com Deus e à sua Palavra (Tg 1.21). Trata-se da presença do Espírito Santo propiciando suavidade, bom trato com o próximo e domínio próprio (Rm 8.10). 

3. O Exemplo de Cristo e Moisés 

As Sagradas Escrituras registram variados exemplos de pessoas com a virtude da mansidão. A própria Palavra, no entanto, arrazoa a respeito de dois exemplos dignos de reprodução e prática de fé, os quais são: o legislador Moisés, que “era um homem muito manso, mais do que qualquer outro sobre a terra” (Nm 12.3 – NAA), e do próprio Cristo: “Eis que o teu Rei aí te vem, manso, e assentado sobre uma jumenta” (Mt 21.5).

A reputação da mansidão de Moisés deu-se em virtude do legislador, entre outros aspectos, não revidar e nem guardar rancor quando foi atacado pessoalmente (Nm 12.1-2). Arão e Miriã, irmãos dele, murmuraram e discordaram de uma escolha que Moises fizera. Ele decidiu casar-se com a “mulher cuxita”, e a rebeldia, críticas, inveja e a competição afloraram na vida dos seus entes queridos. Não obstante, Moisés manteve a serenidade, permaneceu centrado, não revidou o ultraje e aguardou o agir de Deus com paciência.

Por fim, requereu misericórdia a Deus pela vida dos seus acusadores (Nm 12.11-16). O outro exemplo de mansidão como virtude foi demonstrado pelo próprio Deus encarnado em forma humana. Jesus Cristo sofrera diversas calúnias, difamações e ameaças no seu ministério terreno; contudo, sempre manteve o seu infinito poder sobre controle enquanto era constante e injustamente atacado e perseguido. Ressalta-se que, dentre tantos exemplos de mansidão, em certa ocasião, o Messias passava por uma plantação em dia de sábado, e os seus discípulos, que estavam com fome, começaram a colher espigas e a comer (Mt 12.1).

Os fariseus, baseados na interpretação que faziam da Lei, imediatamente o acusaram de profanar o dia do sábado e, por isso, hostilizaram a Jesus (Dt 23.25; Lv 23.14; Mt 12.2). A reação de Jesus não foi a de revidar o ataque, mas de mansamente lhes explicar as Escrituras (Mt 12.3-8) Não bastasse essa controvérsia da colheita em dia de sábado, nesse mesmo dia, Jesus entrou na sinagoga dos judeus e curou um homem que tinha a mão atrofiada (Mt 12.10-13). Diante disso, enfurecidos por aquilo que consideravam ser a violação ao dia de sábado, os fariseus conspiraram com os herodianos para matarem Jesus (Mc 3.6).

Todavia, Cristo, que é manso de coração e rico em sabedoria, não contra-atacou os seus adversários, mas preferiu retirar-se pacificamente da localidade acompanhado de parte dos seus discípulos (Mt 12.15). Quando, finalmente, por permissão divina, os seus algozes levaram-no à cruz, a postura de Jesus foi de benevolência para com eles: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lc 23.34). E, como o cordeiro mudo, evidenciou mansidão e não abriu a sua boca (At 8.32).

4. O Verdadeiro Conciliador

Nesse aspecto, sublinha-se que todo aquele que possui a virtude bíblica da mansidão tem um comportamento de conciliação. Assim, o comportamento conciliador é a demonstração prática da conduta daquele que detém a mansidão. Isso se refere à postura comedida e equilibrada diante de circunstâncias adversas (1 Pe 2.23) e transmite a ideia de pacificação, um meio harmonioso de administrar os conflitos (2 Co 2.10). Desse modo, o ideal cristão é que todos os membros de uma igreja desenvolvam a virtude da mansidão.

Ao alcançar tal propósito, os conflitos desapareceriam entre o povo de Deus. Em lugar de sentimento faccioso, os crentes seriam mansos e conciliadores (1 Co 1.10). Anseia-se, portanto, que os eleitos em Cristo, ao invés de revidarem a ofensa recebida e em lugar de instigarem ou partirem para o confronto, passem a comportar-se com mansidão, buscando o espírito conciliador. As Escrituras registram a conduta de Abigail, esposa de Nabal, como exemplo de espírito conciliador (1 Sm 25.1-35).

O texto bíblico informa que, após a morte do profeta Samuel, quando Davi fugia da face de Saul, Nabal, que tinha as suas possessões no Carmelo e era muito rico, recusou-se em ajudar com gêneros o filho de Jessé (1 Sm 25.1-9). Nabal tratou asperamente os mensageiros de Davi e ainda desdenhou do futuro rei de Israel, considerando-o como homem sem origem, um mero escravo fugitivo (1 Sm 25.10-11). Diante dessa insolência, Davi convocou 400 homens fortemente armados e marchou contra a propriedade de Nabal para vingar o insulto (1 Sm 25.13).

Entretanto, ao tomar conhecimento do ocorrido, Abigail antecipou-se e dirigiu-se ao encontro de Davi levando consigo todo o gênero que tinha sido negado pelo seu marido (1 Sm 25.18). Abigail rogou a Davi que não fizesse justiça com as próprias mãos, porque Deus haveria de julgar os seus inimigos (1 Sm 25.25-31). Assim, a fúria de Davi contra um desafeto foi anulada pela sabedoria e pela força de uma mulher de caráter pacificador (1 Sm 25.32-35).

Nessa narrativa, é possível perceber dois cenários distintos: De um lado, Davi, que cavalgava ávido de vingança em direção à propriedade de Nabal; e, de outro, Abigail, em sentido contrário, que estava montada no seu jumento buscando proteger a sua família por meio do espírito conciliador. Nesse mesmo sentido, Paulo escreve aos Efésios, arrazoando que os cristãos devem exercitar a virtude da mansidão com espírito conciliador, a fim de que a unidade da Igreja seja verdadeira conforme os desígnios divinos previamente estabelecidos (Ef 4.31-32). 

III. A LONGANIMIDADE COMO INSTRUMENTO DE PERDÃO 

1. Longanimidade, fruto do Espírito 

O apóstolo dos gentios finaliza essa orientação listando a virtude da longanimidade. Essa virtude é também imprescritível para o crente salvo em Cristo Jesus. A palavra utilizada por Paulo é o termo grego makrothumia, que tem o significado de paciência, clemência, indulgência e resignação.264 Esse termo é composto por duas locuções gregas, sendo a primeira makro, que significa “longo” ou “grande”, e a segunda thumos, que traduz a ideia de “temperamento” ou “paciência”.

Outrossim, o termo utilizado por Paulo nesse versículo é o mesmo utilizado na lista dos aspectos do Fruto do Espírito Santo (Gl 5.22). O uso da expressão tem o mesmo sentido tanto nos escritos de Paulo quanto nos do apóstolo Pedro. Ambos os escritores empregam o termo “longanimidade” como sinônimo de “paciência”, “tolerância” e “constância” (1 Pe 3.20; 2 Pe 3.9; Cl 3.12,13). Ratificase que a longanimidade é outro dos atributos divinos que deve ser desenvolvido no crente como fruto do Espírito Santo (Gl 5.22). No Antigo Testamento, essa palavra era muito usada para descrever a natureza de Deus.

O Senhor é apresentado como “longânimo” e “tardio em irar-se” (Sl 86.15; Na 1.3). Em termos gerais, essa virtude significa tolerar pacientemente a má conduta dos outros (2 Co 6.3- 6). Isso quer dizer que uma pessoa longânime possui uma grande paciência. Uma pessoa assim é tolerante, clemente e transigente com os erros alheios, não significando, porém, que é conivente ou complacente com o pecado ou que é insensível diante das injustiças, mazelas e iniquidades do mundo perdido.

Literalmente sinaliza um longo fôlego, ou seja, uma grande capacidade de resistência para suportar uma pressão continuada. Nessa direção, a Bíblia Sagrada ensina-nos a sermos “pacientes na tribulação” (Rm 12.12). Portanto, suportar os erros dos outros e as adversidades da vida é o lado prático da paciência. Dessa forma, longanimidade é a ação que deriva tanto da humildade como da mansidão. Outrossim, a longanimidade é essencial em todos os relacionamentos, inclusive nas relações domésticas.

É necessária uma “longa paciência” para um bom trato com o próximo na vida em sociedade, com o irmão no contexto da Igreja e com os integrantes do grupo familiar. O exercício da paciência, contudo, requer a virtude do amor, que é o princípio basilar de todas as ações do crente salvo por Cristo (1 Co 13.1-7). 

2. Suportando uns aos outros 

Para melhor compreensão da importância desse aspecto para preservar a unidade, é preciso ter ciência de que nos deparamos com múltiplas situações de hostilidade durante nossa jornada cristã (At 14.22). E é principalmente nesses momentos conflituosos na Igreja que Paulo exorta-nos a “suportar uns aos outros em amor” (Ef 4.2b). A expressão indica que, infelizmente, teremos de enfrentar abusos cometidos em nosso meio por parte de nossos irmãos da fé. Isso lembra que o outro, normalmente fonte de bênção e de alegria, pode-se tornar fonte de sofrimentos e frustrações na vida de alguém.

Essa fragilidade do outro, as provocações alheias e as atitudes carnais são comparadas a um “fardo” que deve ser suportado por meio da prática do amor. Mercê dessa orientação bíblica para andar de modo digno da vocação (4.1), com toda a humildade, mansidão e longanimidade (4.2a), o apóstolo também nos expõe o modo de fazer isso, ou seja, “suportando-vos uns aos outros em amor” (4.2b). Por conseguinte, concordes com as palavras de João Crisóstomo, endossamos: “Se não suportas o próximo, como Deus te suportará? Se não toleras o companheiro de serviço, como o Senhor haverá de te tolerar? Mas onde há amor, tudo é suportável”